segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Renegado no Náutico, valorizado na Europa

Do Diario de Pernambuco

Sexta rodada do Campeonato Espanhol. Barcelona e Mallorca empataram em 1 x 1 no Camp Nou. Em campo, craques como Messi, Daniel Alves e Iniesta. Entre eles, um pernambucano de Olinda vestia a camisa 3 do time visitante. Entrou como titular. Um jovem de 21 anos, volante, revelado nas categorias de base do Náutico. Pouca gente pode lembrar da rápida passagem de João Victor pelo time profissional do Timbu no ano de 2007. Também pudera, foram poucas as chances dadas ao jovem talento, na época com apenas 16 anos.

Poucas oportunidades, muitas cobranças. Embora mais novo, João Victor surgiu na mesma leva de jogadores como o lateral-direito Paulinho, convocado para a Seleção Brasileira sub-20, os meias Diego e Thiago Laranjeira e o atacante Betinho. Um grupo de garotos alçados para o time profissional numa época (mais uma) de crise do Náutico. Para se ter uma ideia, o técnico que começou dirigindo a equipe em 2007 foi Didi Duarte. Dar valor à base era a "proposta". Na verdade, apenas uma desculpa pela falta de dinheiro no clube.

A pressão foi grande e os garotos sentiram isso. Sozinhos, não conseguiram conduzir o time no Campeonato Pernambucano. Acabaram "queimados", como se diz na linguagem do futebol. De esperança, passaram a refugos, e um a um foi saindo. A história de João Victor passa por isso. Chegou a treinar no Santa Cruz, mas foi levado ao Náutico, que teoricamente apresentava melhores condições nas categorias de base. De cara, impressionou. Foi convocado para a Seleção Brasileira sub-16 e dois meses depois estava integrado ao grupo profissional.

João Victor atuou em algumas partidas como profissional em 2007, mas uma grave lesão o fez parar por pouco mais de dois meses. Ele teve uma hérnia de disco. Segundo o pai dele, Flávio, ex-goleiro do Sport, os médicos do Náutico indicaram a operação. Ele não aceitou, pois o garoto poderia ficar com sequelas e nunca mais jogar. Procurou, por conta própria, um outro tratamento. E achou. Remédios, hidroterapia e pilates curaram a doença. E o garoto, que atuava como volante e meia, retornou ao clube. Mas foi remanejado para os juniores. Foi acusado de fazer corpo mole.

Flávio foi, então, à procura do então presidente alvirrubro, Ricardo Valois. Questionou quais os planos do Náutico para João Victor. Ouviu do dirigente que se tratava de um jogador muito irregular. "Eu pedi o liberatório. Ele (Valois) disse que eu estava louco e mandou eu resolver do meu jeito", lembrou o pai do jogador. "E foi o que eu fiz. Procurei um advogado e pedi a liberação na Justiça. Estavam impedindo o garoto de trabalhar. Conseguimos porque o clube não depositou cincos meses de FGTS dele."

Rivaldo - Por cinco meses de não depósito de FGTS o Náutico perdeu um grande valor das categorias de base. Em 2008, João Victor seguiu para os juniores do São Caetano, mas, sem oportunidade, retornou. Foi jogar no Treze/PB. "Ali ele sofreu, mas foi importante para ele ver que a carreira de jogador não é assim tão fácil", contou Flávio. Foram seis meses no time paraibano e então o pai do garoto enviou um DVD dele para Ricardo, irmão de Rivaldo. O material chegou às mãos do craque, que se encantou.

Rivaldo fez uma proposta para empresariar o jogador. O levou ao Mogi-Mirim, time que preside, onde não passou nem uma semana. O contato com o Bunyodkor, time em que Rivaldo jogou no Uzbequistão, já estava feito. Contrato assinado, João Victor atuou por toda a temporada 2009/2010. Junto com o pentacampeão, que tem uma história muito parecida com a dele, conquistou títulos.

Ao final da temporada, o contrato com o Bunyodkor chegou ao fim. Junto com Rivaldo, ele deixou o clube. E surge então a proposta do Mallorca. Contrato por cinco temporadas. Inicialmente, João Victor chegaria para atuar no time B. Mas agradou ao técnico da equipe espanhola - ninguém menos do que Michael Laudrup - e foi integrado à equipe principal. De seis jogos do Espanhol, entrou no segundo tempo contra Real Sociedad e foi titular pela primeira vez contra o Barcelona. Marcou o craque argentino Lionel Messi. Teve atuação elogiada. Do Brasil, a família o acompanhou pela televisão. "Estou muito orgulhoso. Hoje, ligo a televisão e assisto ao meu filho jogando num dos principais campeonatos do mundo", disse Flávio.

Ex-goleiro, revelado no Sport, onde conquistou títulos, Flávio fala com propriedade. "É muito difícil para um atleta da base crescer aqui em Pernambuco. Tive propostas quando jogava no Sport, mas nunca me liberaram. Depois, me dispensaram", afirma. "Hoje agradeço de João Victor ter saído daqui. Ele está bem, morando com a esposa, vai ser pai. Mas ainda pergunto: 'será que esse garoto que não tinha qualidade para jogar no Náutico?' Eles constroem e eles mesmo destroem. Infelizmente é assim."

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