Nas primeiras semanas de 1996, o Newcastle estava preparado para levantar a taça do Campeonato Inglês. O time comandado pelo técnico Kevin Keegan tinha 12 pontos de vantagem sobre o segundo colocado Manchester United. O meia francês David Ginola inspirava terror nas defesas adversárias, com cruzamentos milimétricos que o atacante Les Ferdinand mandava regularmente para o fundo das redes.

Se tudo isso ainda não bastasse para transformar o Newcastle em franco favorito, a contratação do craque colombiano Faustino Asprilla fechou a conta da corrida pelo título — literalmente, no caso de um famoso agente de apostas que pagou caro por ter cravado que o troféu iria para Tyneside. Talvez ele tenha dado ouvidos demais aos torcedores que bradavam o hino do clube e agitavam as suas camisas alvinegras no gélido inverno do nordeste da Inglaterra. Deveria ter escutado o velho dito popular: só acaba quando termina.

De fato, terminaria vermelho como o uniforme dos Red Devils. Enquanto Ginola e o Newcastle perdiam o pique, outro francês comandava a maior virada da história da Premier League até hoje. No início de março, Eric Cantona marcou o único gol da vitória do United no St. James Park. Ao lado de Peter Schmeichel, Roy Keane, David Beckham, Ryan Giggs e companhia, Cantona foi o protagonista da incrível recuperação do time de Alex Ferguson, que somou 40 pontos em 45 possíveis e encerrou o campeonato quatro à frente dos Magpies.

A espetacular campanha do Newcastle chegava ao fim de maneira indigesta. Agora, 15 anos mais tarde, outro adversário está empenhado em fazer o United provar desse mesmo gosto amargo. Curiosamente, um adversário que estava mergulhado em crise há apenas quatro meses.

Depois de vencer as cinco primeiras rodadas com média de 4,2 gols por jogo e de passar sete das primeiras nove partidas sem ser vazado, o Chelsea começou a cair de produção de maneira dramática em novembro. No começo do ano, a derrota para o lanterna Wolverhampton deixou o time londrino com apenas uma vitória em nove jogos. O ex-líder aparecia em quinto na tabela, a 15 pontos do primeiro colocado. Frank Lampard, Florent Malouda e Didier Drogba viviam a sua pior fase com a camisa do clube, enquanto o atacante Fernando Torres completava alarmantes 903 minutos sem fazer gols.

O técnico Carlo Ancelotti chegou a admitir que o campeonato do Chelsea havia chegado ao fim. Naquelo momento, todos apostavam que a passagem do italiano por Stamford Bridge terminaria assim que o clube encerrasse a sua campanha na Liga dos Campeões da UEFA. No entanto, quando foram eliminados do torneio continental — graças a duas derrotas magras para o Manchester United nas quartas de final —, os Blues vinham em franca ascensão na Premier League. Na verdade, o time conquistou 25 dos 27 pontos que disputou e, caso volte de Old Trafford com uma vitória no próximo domingo, chegará à penúltima rodada na liderança do Inglês pelo critério do saldo de gols (os dois clubes têm saldo positivo de 38).

"O United estava escapando, mas eu sempre acreditei", conta o capitão John Terry. "O técnico fez a coisa certa e manteve a ambição dos jogadores. Os torcedores também fizeram isso, eles nunca nos deixaram desistir e achar que estava acabado. Não há incentivo maior do que ir a Old Trafford e vencer para ficarmos em condições de trazer o caneco de volta para casa", completou o zagueiro do Chelsea.

"Foi uma temporada cheia de altos e baixos", analisa o meia Michael Essien. "Começamos muito bem, o meio da campanha foi azedo e na reta final recuperamos a força. Posso garantir que estamos à altura do desafio. O time está jogando bem e não tenho dúvidas de que daremos tudo para derrotar o Manchester United."

Embora o United tenha ótimo retrospecto jogando em casa na atual temporada, o momento do Chelsea é melhor: Essien, Frank Lampard, Florent Malouda e Didier Drogba recuperaram o bom futebol; a contratação do brasileiro David Luiz trouxe novo vigor à zaga; Salomon Kalou anotou alguns gols decisivos e Ancelotti foi escolhido técnico do mês em sucessivas ocasiões recentemente.

"É o melhor momento para jogarmos lá, porque agora a nossa condição e boa e temos que aproveitar o impulso", avalia Ancelotti. E será que o Chelsea vai levantar a taça? "O futebol é estranho. Se isso acontecer, será algo realmente estranho."

Mais estranho, ainda, do que quando o francês da inconfundível gola levantada voltou de oito meses de suspensão para comandar a histórica reviravolta de 1996 no St. James Park. Conseguirá o Chelsea encontrar o seu Cantona no "Teatro dos Sonhos" neste domingo?

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